sexta-feira, 27 de julho de 2007

Pedantismos Ocidentais

Estava eu a corresponder-me com o Lauro António sobre esta terrível doença chamada orientalismo e lembrei-me que isso poderia ser um bom tema para um artigo também. Tive este ano a oportunidade de fazer um trabalho na universidade sobre este ensaio que eu já tinha como referência de lucidez intelectual, de esclarecimento e de reflexão e que eu já tinha utilizado em praticamente todos os trabalhos que tive que fazer para a universidade.

Estas preocupações que alimento provêm de traumas pessoais nos quais eu assisti a professores catedráticos de filosofia da minha universidade a desenvolverem discursos pseudo-progressistas baseados no racismo e no etnocentrismo cultural, discrusos nos quais culpavam o Confucionismo pela Revolução Cultural e pelo sistema totalitário na China (minha santa ignorância! Viva ao estado medíocre do intelectualismo e do academismo português!). Mas também provêm dos inúmeros textos onde proliferam referências asiáticas para ornamentar com exotismo os nossos textos ou pensamentos de ocidentais cultos.
Então se nem o meio intelectual é de facto informado e tem uma visão lúcida das coisas, é normal que acabem por se propagar ideias pré-formadas mal estabelecidas em relação ao espaço que declaramos como ‘oriental’ e que isso se venha a traduzir em mera xenofobia e preconceito.

Não tenho aqui o trabalho que fiz para a disciplina… também não é que esteja uma obra de arte – podia ter-me esforçado mais, confesso (avaliações de Chinês a mais!). Mas fica a sugestão do livro Orientalismo de Edward Said. É claro que é necessário ter em conta o tom panfletário do autor, mas sejamos sensatos – ele tem as evidências do seu lado.



Como representamos outra cultura? O que é outra cultura? Será que a noção de uma cultura distinta (ou raça, ou religião, ou civilização) é útil, ou será que sempre se envolve em auto-satisfação (quando analisamos a nossa) ou em hostilidade e agressão (quando analisamos a ‘outra’)? As diferenças culturais, religiosas e raciais importam mais que as categorias sócio-económicas ou que as categorias político-históricas? Como é que as ideias chegam a adquirir autoridade, ‘normalidade’ e até mesmo o estatuto de verdades ‘naturais’? Qual é o papel do intelectual? Existe para dar validade à cultura e ao estado a que pertence? Que importância deve o intelectual atribuir a uma consciência crítica independente, a uma consciência crítica de oposição? Estas são algumas das questões que esta obra de referência universal procura elucidar.

Fonte das civilizações e línguas europeias, o Oriente é também seu adversário cultural e uma das imagens mais profundas e recorrentes do Outro, no que ajudou a definir a Europa (ou o Ocidente) como contraposição à sua imagem. Porém, o Oriente não é um facto inerte da natureza: não está ali, do mesmo modo que o Ocidente também não está ali. Enquanto entidades geográficas e culturais – para já não dizer históricas – Oriente e Ocidente são criações do homem. O Oriente não é o ‘Oriente’ – é ‘o Oriente tal como foi orientalizado’. Na análise de Said, esse processo tem na sua essência a distinção inalienável entre a superioridade ocidental e a inferioridade oriental, distinção essa que se foi aprofundando e endurecendo ao longo da história, como este livro pretende demonstrar. O orientalismo pode, portanto, ser analisado como uma instituição corporativa que se relaciona com o Oriente emitindo juízos sobre ele, autorizando visões dele, descrevendo-o, ensinando-o, colonizando-o, governando-o. Em suma: será um estilo ocidental para dominar, reestruturar e exercer autoridade sobre o Oriente.
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*Ver Cartoon*
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Mas podemos nós dividir a realidade humana, como efectivamente ela parece estar dividida, em culturas, histórias, tradições, sociedades e raças claramente diferentes entre si, e continuar a viver assumindo as consequências dessa divisão? Existe um modo de evitar a hostilidade manifestada pela divisão dos homens entre ‘nós’ (ocidentais) e ‘eles’ (orientais)?

Um dos principais dogmas do orientalismo é a absoluta e sistemática diferença entre o Ocidente – racional, desenvolvido, humanitário e superior – e o Oriente – aberrante, subdesenvolvido e inferior. Outro dogma é o de que as abstracções sobre o Oriente, especialmente as que se baseiam em textos que representam uma civilização oriental ‘clássica’, são sempre preferíveis aos casos directos extraídos das realidades orientais modernas. Um terceiro dogma é o de que o Oriente é eterno, uniforme e incapaz de se definir a si próprio; considera-se, consequentemente, que um vocabulário altamente generalizado e sistemático para descrever o Oriente de um ponto de vista ocidental é inevitável e, inclusive, cientificamente ‘objectivo’. Um quarto dogma é o de que, no fundo, o Oriente é algo a ser temido, ou algo a ser controlado através da pacificação, investigação e desenvolvimento, ou ocupação pura e simples sempre que tal seja possível. Estes estereótipos foram necessariamente reforçados no mundo electrónico pós-moderno de hoje; a televisão e todos os recursos mediáticos obrigam a uma informação cada vez mais estandardizada, que inunda a imprensa e a mente popular. O que acaba por vir sempre ao de cima é a presunção de que o consumidor ocidental, embora pertença a uma minoria numérica, tem o direito de possuir ou de gastar (ou de ambos) a maioria dos recursos mundiais; na verdade acredita ser prerrogativa humana sua não apenas administrar o mundo não-branco, mas também possuí-lo, apenas porque, por definição, esse mundo não-branco não é tão humano quanto ‘nós’ somos.

Que energias intelectuais, estéticas, eruditas e culturais participaram na elaboração de uma tradição imperialista como a orientalista? Como puderam a filologia, a história, a biologia, a teoria económica e política, a literatura servir a visão que o mundo imperialista teve do orientalismo? Que mudanças, refinamentos e mesmo revoluções ocorrem no seio do orientalismo? Qual é o significado da originalidade, da continuidade, da individualidade, neste contexto? Como se transmite e reproduz o orientalismo de uma época para outra?

+ página das edições Cotovia - o livro...

2 comentários:

Anónimo disse...

Uma professora de filosofia já por si só é algo que se deve sempre olhar com suspeita, mas quando ainda por cima é loira e usa um penteado saido de um dos primeiro episodios do Sexo e a Cidade, entao o caso torna-se muito grave. E aí a problemática do orientalismo torna-se subitamente catastrófica...

Artur Corvelo disse...

Até se vai compreendendo que exista o tal preconceito sobre o oriente. trata-se de uma das leis elementares da física - o 'pro-orientalismo' também é uma chusma de preconceitos e frases feitas, (3ª? 2ª?)