domingo, 13 de março de 2011

Nós, os jovens


Sem dúvida que estávamos a precisar de um grito destes para manifestar a nossa existência, para mostrar que, sim, estamos aqui a perseguir expectativas – nossas ou de outros - que não conseguimos cumprir. Vivemos numa realidade ilusória de mobilidade social coerente para nos apercebermos de que afinal a mobilidade social não é tão bem estruturada como um dia pensámos que fosse. Agregados aos problemas meramente políticos e económicos, sentimos a frustração de viver num país envelhecido que nos reprime qualquer sentido de irreverência intelectual e cultural e que é contagioso e que torna os jovens muito mais velhos do que aquilo que são.

E quando se está à rasca quer-se mudar essa situação. Quer dizer, parece lógico, quando se está mal quer-se estar bem. Querer estar bem por si só pode ser um ponto de partida e, nesse sentido, estar-se lúcido da sua condição - ou falta de condições - já é muitas vezes uma conquista. No entanto, será meramente um ponto de engrenagem. A partir desta constatação é a procura de uma solução que ocupará o espaço dedicado à continuidade desta determinação. Essa procura tem, no entanto, que se construir concretamente, fundamentada num projecto ideológico coerente com objectivos mas também com métodos, ou seja, meios para atingir um determinado fim.

Ao exporem-se também se lhes deixam avaliar as falhas. Por exemplo, somos imparciais e possuímos esta herança social do consenso, do “dar-se bem com toda a gente” que simplesmente nos faz perder qualquer personalidade, sobressaindo também a cobardia de encarar quem nos opõe. Mais, esta determinação apolítica não é mais do que ignorância por um lado e desinteresse por outro – embora estas duas facetas estejam correlacionadas. Por um lado, não decidir também nos varre a necessidade do conhecimento que nos conferirá a capacidade de decisão de entre as várias posturas possíveis. Por outro, parece que ninguém quis saber de política para nada até as coisas nos afectarem a nós. E é precisamente neste ponto, nesta incapacidade de criar um movimento próprio com ideias próprias que surgem os gritos por liberdade no meio de uma manifestação sobre precariedade laboral. Será que nos metemos na máquina do tempo e recuámos 40 anos? Mais ou menos, é que esta geração precisa de pegar nas vozes dos pais, que são as vozes revolucionárias que conhecem e que são uma referência de uma geração que não é esta, de uma realidade que não é esta. Depois há aquele ódio típico ao governo, como se o problema fosse o Sócrates e não a Merkel, como se o problema não fosse inquestionavelmente europeu. O governo tem tentado preservar o pouco estado social que ainda possuímos mas se não é o suficiente, porque não é, então terá que haver uma mobilização ainda mais à esquerda e uma mobilização coesa, com ideologias claras, que se defina e, acima de tudo, que crie um projecto focalizado na ideia de mudança de intenções de voto.

Um dos aspectos mais positivos da manifestação é sem dúvida a visibilidade internacional. Porque como o pessoal lá fora não ouviu as entrevistas na rua durante a tarde em que um skinhead falou, uma anarquista falou, uma defensora dos direitos dos animais falou, o Cavaco Silva falou, o senhor que precisava de renovar a canalização da casa falou, realmente estas 300 mil pessoas na rua até parece que estavam todas de acordo em relação ao fim dos contratos a prazo e dos recibos verdes… pelo menos passar essa ideia, vale sem dúvida a pena. Agora, resta repensar o movimento. O Jel e o Falâncio têm piada mas, deixem-me recordar que eles fazem sátira aos próprios militantes de esquerda! Parem lá de gritar “quero dinheiro para comprar um carro novo” porque isso é uma profunda ironia, por muito que não pareça e por muito que ter um carro novo seja efectivamente apelativo… mas sim é uma ironia!! Quem diria!... Pronto, enfim, já fiz o meu exercício de escrita e quero deixar registado o meu apelo para que se repense este movimento, vamos pôr aqui um governo que se está a borrifar para os mercados internacionais e para a Europa… só para ver no que dá! Porque isso, sim, seria irreverente e seria diferente. Ok, não necessariamente a borrifar mas, pelo menos, que a repensasse à luz de uma perspectiva de união real e não de divergências que só nos escravizam. 

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