segunda-feira, 6 de julho de 2015

OXI


As correntes tradicionais de leitura das Relações Internacionais, nomeadamente o Realismo e o Liberalismo apresentam uma forma de atuação dos estados-nação no palco internacional sempre racionalmente explicado às audiências de uma só forma. Nos discursos de defesa dos interesses estatais, integram-se as medidas que concernem a políticas de defesa militar do estado da mesma forma que integram o discurso da defesa dos interesses económicos de um estado. Sempre na perspetiva de que a estabilidade doméstica justifica posicionamentos externos. O que torna a “defesa de interesses” objeto de reflexão é a sua definição e composição. Os “interesses” podem basear-se em características que divergem entre si muitas vezes de acordo com as características culturais específicas de cada estado, ou seja, consoante a sua identidade.

A explicação única da “defesa dos interesses nacionais” torna-se vaga e sujeita a interpretações. Para Portugal essa justificação é anexada a medidas que não coloquem em questionamento a ordem económica vigente de índole neoliberal da atual zona euro. Mantemos assim os brandos costumes de Eça de Queirós e a memória recente de uma ditadura conservadora.

Richard Ned Lebow no seu livro “Why Nations Fight” escreve sobre quatro principais motivos que historicamente desencadearam as guerras ao longo do tempo: medo, interesse, posicionamento e vingança. Esta é uma abordagem interessante à luz da história grega. A famosa moral ateniense e espartana. De lembrar que "Espartano" significa em várias línguas “rigoroso” ou “desprovido de coisas supérfluas” tal como os povos da Lacónia que nos deixaram o adjetivo “lacónico”, direto, incisivo. A filologia pode ajudar-nos a identificar o tipo de características gregas com as quais nenhum outro país europeu se pode comparar. Claro que falamos de uma identidade ancestral que se dissipa e se volta a instaurar soberanamente nas revoltas contra o domínio Turco, na anexação da Macedónia e com a entrada na I Guerra Mundial no lado dos Aliados, vivendo em monarquia até 1922 e um período de ditadura militar de 1967 a 1974. Desde que retomou o rumo republicano e democrático, salienta-se o investimento que os gregos sempre fizeram em armamento e defesa, um investimento bastante acima da média europeia.




A vitória de janeiro deste ano de um partido como o Syriza acrescenta linhas à vastíssima história grega, revelando uma consciencialização da população mais uma vez não comparável à de qualquer outro europeu. A proclamação dos interesses nacionais não deixa de ser um discurso também ele utilizado por Tsipras ou Varoufakis. O seu entendimento e interpretação é que são outras. Se o interesse de sobreviver financeiramente exige padrões de vida indignos e suspende a liberdade política e social, esse é também um motivo de tensão entre estados e essa regra das Relações Internacionais aplica-se mais uma vez na relação da Grécia com a Zona Euro. Neste fim de semana, resultado de um referendo utilizado pelos poderes ilegítimos e antidemocráticos do capital, com os rostos de Merkel, Draghi e Lagarde mas incluindo os dirigentes europeus que pouco têm dignificado os seus estados incluindo Passos Coelhos e Mariano Rajoy.


Foram as características culturais específicas que deram uma vitória massiva do Não ao domínio neoliberal europeu e são elas que continuam a fazer com que em Portugal a televisão seja dominada por uma elite económica não intelectual cujos mandatos de propaganda continuam a modelar as mentalidades. Chegou a altura de denunciar o assalto à dignidade, à soberania e aos valores democráticos e chegou a altura de um "Não" português. Ninguém é dono da Europa e com ou sem a Grécia dentro da unidade monetária, poucos são os países que vão continuar a representar o valores europeus como os gregos o fazem. 

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